Reflexão sobre Capital Social e Desenvolvimento Socioeconômico

Conversas nos corredores da UENF com o meu amigo Rogério Castro motivaram a reflexão sobre o tema Capital Social / Desenvolvimento e a nossa região. Daí uma primeira percepção. Se a evidência de Capital Social num ambiente está na identificação de ações de cooperação, reciprocidade, confiança, respeito às normas e sentimento de pertenciamento; não podemos eliminar a perspectiva de existência de algum grau de Capital Social na região. Por outro lado, a literatura afirma que certo grau de Capital Social potencializa o desenvolvimento local/regional. Neste caso, temos alguns nós a desatar, já que, particularmente, entendo que o aprofundamento do subdesenvolvimento na região é função exatamente da ausência de capital Social.

Para entender o assunto, vamos desvendar alguns pontos. Vou usar São João da Barra como unidade de análise, já que conheço bem algumas práticas que nos ajudarão. Por exemplo, posso afirmar que a população é extremamente solidária e está sempre pronta para atender indivíduos ou famílias em apuros, sendo conhecida ou mesmo estranha à cidade. Já vi casos de proteção total a uma família recém chegada, cujas articulações partiam de um pequeno grupo que levantava fundos e alimentos na comunidade, de maneira a manter esta família sob condições humanas. Outras ações de solidariedade a moradores da cidade são incontáveis, seja através de rifas, bingo, partida de futebol e outras estratégias, sempre em busca do levantamento de recursos para os beneficiários. É importante frisar que nesses casos não existe, definitivamente, qualquer movimento de desvio de recursos. Essa contabilidade sempre fecha perfeitamente.

Outros exemplos vêm da organização social, especialmente, os clubes. Diversas organizações funcionam muito bem, a partir dos esforços de suas lideranças. Destacam-se nesse grupo, o clube da terceira idade que resgatou o ambiente de bailes e a possibilidade de convivência entre os beneficiários; os clubes de veteranos que articulam com a comunidade e conseguem levantar patrimônio, sem a existência de maiores conflitos, etc. Vale lembrar ainda a organização do carnaval, envolvendo Congos e Chinês e outros, que no passado, levantavam os recursos na própria comunidade e as famílias doavam o seu tempo para construir a festa que orgulhava a todos. Outras manifestações como as festas religiosas e culturais, organizadas pelas famílias e inexistentes na atualidade, também seguiam a mesma base de organização.

Finalmente, os grupos religiosos, como sabemos, apresentam uma capacidade extrema de interação com a sociedade e conseguem viabilizar a sua evolução espiritual e patrimonial, tendo como base: credibilidade, confiança e respeito de todos.

Bem, é inegável que o quadro traçado indica um forte contexto de Capital Social. E porque então o mesmo não potencializa desenvolvimento socioeconômico? Se observarmos, em nenhum dos exemplos aparece a figura de governo e a sua liderança por uso do orçamento. Exemplificamos manifestações sociais, esportivas e religiosas autônomas e independentes. Algumas delas, como o carnaval atual e alguns clubes de futebol, do momento em que passaram a receber recursos públicos, mudaram a sua identidade e construíram um novo ambiente próspero para a corrupção e conflitos diversos.

Essa reflexão encaminha para conclusão de que a presença do setor público e o seu empoderamento sobre os grupos da comunidade, com o tempo, construíram uma posição hierárquica trágica, onde a supremacia pública e a total dependência da sociedade a esta esfera, amorteceu o Capital Social existente e criou a cultura de que o público não é de ninguém e, portanto, devemos concorrer a uma parte desses recursos. Desta forma, a solidariedade, a cooperação a reciprocidade e o senso de pertencimento desaparecem e dão lugar a posição de conflitos, alta corrupção e deterioração do tecido social. Como o desenvolvimento depende do orçamento público, o processo fica contaminado pelo estagio de evolução da democracia local/regional.

Acredito que a presente discussão auxilia um melhor entendimento sobre o comportamento atual dos membros da comunidade sanjoanense que não difere das outras comunidades que compõe a região. Assim, a luta pelo desenvolvimento deve continuar, entretanto o grande gargalo está, exatamente, no agente responsável pela condução do mesmo.

Comentários

  1. Oi Alcimar, excelente reflexão!

    Precisamos discutir mais sobre esse gargalo.

    E a universidade não pode ficar de fora desta discussão. Sugiro a formalização de debates com esse tema dentro da universidade.

    Abs

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  2. Obrigado Elza. Você tem razão sobre o exercício do debate sobre o tema. Abraços

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