Contribuição para o entendimento da crise fiscal em Campos dos Goytacazes - RJ
Um
problema de qualquer natureza com diagnóstico inadequado, combinado com um
baixo padrão de vontade política adequado para a solução do mesmo, representa
um gargalo importante que tende a prorrogar a extensão do problema em
referência. Acredito que essa concepção ajuda a entender a crise orçamentária
dos municípios produtores de petróleo da Bacia de Campos, fundamentalmente,
Campos dos Goytacazes com a maior representatividade, em temos de arrecadação de royalties de
petróleo no país.
No
caso específico, podemos observar a existência de uma crise financeira séria no
município, cujo diagnóstico remete a
responsabilidade para o ambiente externo. Para os governantes, o município se
encontra nessa situação por conta da forte desvalorização do preço internacional
do petróleo, a partir da segunda metade de 2014. Ainda consideram a tese de que
foram pegos de surpresa, daí a grande dificuldade de solução da situação
presente.
Eu
diria que a presente visão é simplista e dificulta um pensamento mais
estratégico em direção aos reais componentes da possível solução do problema.
As lideranças políticas não deveriam ter medo de assumir as fragilidades de sua
gestão fiscal, até porque o governo tem méritos. Por exemplo, em termos
relativos as parcelas das receitas correntes destinadas para investimento no
município, podem ser consideradas como referência no país. Nos últimos anos
esse percentual ficou próximo dos 17% das receitas correntes realizadas, caindo
em 2015 para um percentual em torno do 10%.
Porém,
a fragilidade do diagnóstico reflete a dificuldade de planejamento. Fica claro
que o município não observou um princípio importante da Lei de Responsabilidade
Fiscal. Segunda a mesma, os municípios devem prezar por uma gestão fiscal
equilibrada, em função da implementação de ações planejadas de longo prazo,
onde os orçamentos anuais estejam em consonância com o plano plurianual. Essa
condição inibe desequilíbrios, já que despesas não são criadas sem a garantia
de novas receitas.
Neste
caso, o quadro de crise financeira mostra a inobservância do executivo às
mudanças de cenários, tanto no ambiente externo, quanto no ambiente interno.
Parece que a visão dos gestores ficou focada na expectativa otimista em relação
a permanência das rendas petrolíferas. Ignoraram a crise financeira americana
de 2008 e os seus desdobramentos na Europa, América Latina e até mesmo, os
seus reflexos na desaceleração da forte economia chinesa. E o quem isso tem a
ver? A economia mundial mais fraca demanda menos petróleo e como a oferta é
crescente, especialmente, por conta do processo de produção não convencional,
como o gás de xisto nos Estado Unidos, a desvalorização do preço do petróleo
era evidente. Como consequência, ocorreria a redução das receitas dos
municípios produtores, cuja dependência dessa transferência constitucional nos
seus orçamentos é importante.
O
gráfico a seguir, mostra que a participação relativa das receitas de royalties
de Campos dos Goytacazes, no total de receitas dos municípios do país, variou
em torno de 15% até 2009. A partir de 2010 essa participação experimentou uma
trajetória de queda, chegando a 8,59% em 2015.
Importante
observar que a trajetória das receitas de royalties de petróleo de Campos dos
Goytacazes, mantém uma forte correção (grau de influência) em relação a
trajetória das receitas totais, distribuídas a todos os municípios do país. No
período analisado, as transferências para Campos dos Goytacazes exercem uma
linearidade com as transferências totais, cujo coeficiente é de 0,931060149 na
escala de 0 a 1. Observa-se que o crescimento absoluto dos royalties em Campos
é mais lento do que o crescimento no país.
Entretanto,
na análise da produção de petróleo em barris, o estado do Rio de Janeiro
apresenta um grau de influência, ainda forte, porém menor do que no contexto
das receitas. Em volume físico o estado mantém um grau de influência de 0,859642
em relação ao Brasil, fato verificado em função do processo de crescimento
contínuo da produção de petróleo no país, enquanto o estado do Rio de Janeiro
apresenta uma trajetória de queda da produção, a partir de 2010.
O
gráfico a seguir, mostra uma certa linearidade na evolução do crescimento da
produção entre as duas unidades, no período entre 2001 a 2009. A partir desse
ponto, verifica-se um maior distanciamento, caracterizando uma situação oposta
de crescimento da produção no pais e queda na produção no estado. Nesse caso, a
perda de produtividade no estado do Rio de Janeiro é visível. Em 2009, o estado contabilizou
uma produção equivalente a 85,02% da produção do país e em 2015 (janeiro a
setembro) a participação declinou para 66,87%.
Como
conclusão, fica evidente que este quadro já indicava problemas, há pelo pelos cinco
anos. Tudo indica que a acomodação orçamentária às rendas de petróleo, não
possibilitou um pensamento estratégico em direção a um melhor aproveitamento
dos recursos locais para a indução a novos negócios sustentáveis. Pesquisas
realizadas pelo laboratório de Engenharia de Produção da UENF, tem acentuado a
fragilidade do município na produção dos diversos bens de consumo interno. No
setor agropecuário a situação é alarmante, já que parcela substancial das
necessidade internas é importada, gerando riqueza e emprego fora. No setor
energético, onde o município tem tradição e conhecimento, já que a atividade
sucroalcooleira se confunde com a sua própria história, a produção de etanol para
o atendimento do consumo interno é menor que 1%. Veja que olhar essa questão
com maior cuidado pode representar o início do processo de independência e
transformação econômica do município.
Obs.: Os dados são da ANP e Transparência municipal.
Parabéns pela análise. A verdade é que precisamos cada vez mais de profissionais competentes em cargos executivos e não "apadrinhados"que só concordam com decisões eminentemente políticas.
ResponderExcluirPerfeito Claudio, entretanto a nossa democracia precisa amadurecer um pouco mais.Por enquanto, as forças políticas ainda mantém a sociedade refém. Os organismos não governamentais, especialmente, nas pequenas e médias cidades não conseguem alcançar um padrão de organização que lhe permita mais independência. Esse é um grande problema! Abraços!
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