Viagem de observação a Venda Nova do Imigrante no Espirito Santo
Após cuidadosa observação verifiquei indicadores disponíveis, os quais me levaram a seguinte conclusão: “os números por si só não expressam a real situação da dinâmica econômica em um ambiente, sobretudo quando esse olhar é rigidamente pontualizado, portanto, não sistêmico”.
A tabela a seguir apresenta um conjunto de indicadores sobre os dois municípios que, com a devida integração de elementos fundamentais observados, nos permitiu realizar a presente leitura.
Rapidamente podemos identificar que São João da Barra tem uma população 53% maior do que a população do município capixaba, além de uma área geográfica 144% maior.
A riqueza medida pelo Produto Interno Bruto (PIB) a preços de mercado no município fluminense é 335% maior, assim como e o PIB per capita (por pessoa) é 180% maior. No que diz respeito à estrutura orçamentária, o município capixaba apresentou um valor de receitas correntes em 2009, equivalentes a 17% do valor realizado em São João da Barra. Entretanto, o olhar somente através desses indicadores não deixa dúvidas da supremacia esmagadora de São João da Barra. Entretanto, a situação é bem outra. Inserindo elementos de nossa observação o quadro muda fundamentalmente. A pequena cidade apresenta um padrão habitacional, onde sobressaem construções de alto valor monetário. Não há sinais de miséria aparente. Os pequenos produtores rurais estão bem integrados a cidade, já que a proximidade geográfica e a comunicação é uma realidade.
As moradias mais simples apresentam um padrão médio com conforto e segurança. Como a economia é bem diversificada, a oferta de trabalho ocorre mais equilibradamente nas seguintes atividades: produção de pedras, agropecuária, pequenas fábricas, comércio e turismo. O negócio de grande destaque e motivo da visita é o “Circuito do Agroturismo” que conta com a liderança importante da Fazenda Carnielli no município de Venda Nova do Emigrante. Este circuito, baseado na gastronomia e no turismo, possibilita a interação entre o turista e os processos de produção agroindustriais por grupos familiares e, neste caso, se destacam as atividades de artesanato; plantações de frutas e legumes; produção de pães, bolos, biscoitos e doces; hospedagem rural; pesca; produção de vinhos, socol, defumados e queijos; produção e classificação de café; produção de morangos, produção de cachaça e açúcar mascavo, etc.
A atividade cafeeira se destaca na região e lá é encontrado o Jacu Bird Coffee, na fazenda Camocim. Trata-se de um café classificado como super premium, considerado o mais raro do Brasil. O processo depende da ave Jacu que após se alimentar de grande quantidade dos melhores frutos, elimina-os nos pés das árvores. Os funcionários da fazenda colhem esse material que é secado, limpo e torrado para consumo. Esse produto chega ao preço de R$360,00 o quilo. O restante da produção segue o processo classificado de orgânico e biodinâmico, em função da não utilização de produtos químicos, fertilizantes ou fungicidas. O mercado exterior é muito importante na aquisição desses produtos.
Uma pergunta interessante seria: Por que são verificados processos exitosos somente em alguns lugares? Na verdade estamos buscando essas respostas. Neste caso especialmente, alguns fundamentos são importantes. A organização produtiva está baseada no conceito do agronegócio e cadeias produtivas, já que integra as atividades agropecuárias, processamento industrial, serviços e comércio no território; no conceito de produção flexível, já que uma diversidade de produtos de alto valor em pequena escala é disponibilizada nos pontos espalhados do circuito para atender as demandas dos turistas de grandes centros; no conceito de que o território é importante para integrar escala de produção; na visão de que o conhecimento e a tecnologia são preponderantes para agregar valor aos produtos e, fundamentalmente, que a construção de confiança permite o avanço de redes horizontais que são fundamentais para a dinâmica econômica.
Vivem na região, descendentes de italianos desde o ano de 1888. A rede estruturada informalmente conta com um grande número de famílias de origem italiana e com vínculos de parentesco, o que pode ser um fator importante. Entretanto, o fator trabalho ampliado (disposição, comprometimento, conhecimento, formação profissional, capacidade gerencial), deve ser considerado como essencial para o sucesso dessa região.
O resultado da combinação desses elementos às condições geográficas favoráveis, tais como: boa oferta de água, terra produtível e recursos financeiros, completam o quadro de boa condição de uma cidade, apesar de não contar com um orçamento robusto. Em 2009 o município contabilizou um valor de Receitas Correntes equivalente a 17% da Receita de São João da Barra. Em contra partida, a riqueza gerada no município é bem distribuída e é resultado da combinação de recursos produtivos locais, o que permite gerar, por exemplo, depósitos a vista do setor privado 116% maior do que os depósitos em São João da Barra.
Um outro indicador interessante é o número de emprego formal. Veja que o município capixaba com uma população 35% menor do que a de São João da Barra, um PIB 77% menor, sem royalties de petróleo e sem os bilhões de investimentos no complexo de portuário do Açu, contabilizou 4.535 empregos em 2009, enquanto que São João da Barra contabilizou 5.715. Essas questões nos levam ao entendimento de que o substancial volume de recursos que ingressa em São João da Barra, segue o seu fluxo em direção ao poder público que se encarrega de gerenciá-lo de maneira concentradora, não gerando externalidades positivas essenciais e, conseqüentemente, permitindo uma cidade com forte desigualdade social.
No caso do município capixaba, a realidade é menos perversa, já que a riqueza gerada segue o caminho do sistema produtivo, refletindo empregos e salários bem distribuídos com reflexo no bem estar social. O governo com o seu pequeno orçamento cuida da infraestrutura física e social e as ações são mais democráticas, já que a participação da sociedade é mais aparente do que em São João da Barra.
Em termos de estrutura, o município ostenta o poder econômico e político, em função da presença de concessionárias de automóveis de luxo, rede com quatro agências bancárias, rede de restaurante e hoteleira importante, três faculdades (incluída o Instituto Federal), representações como: IBGE, SEBRAE, Secretaria Estadual de Fazenda, cooperativas agrícolas e de crédito. Como podemos verificar os sinais de riqueza e força política só são encontrados em cidades que podem sustentar o funcionamento dessas organizações.
Parabéns pelo trabalho. O efeito comparativo foi sensacional! Dá-nos uma visão ampliada do que é o diferencial da organização produtiva capixaba. Há 2 anos estivemos por lá, visitamos os Carnielli e outros. Só não conhecemos o "Jacu". Fico feliz de ler esse trabalho agora. Creio que o nosso noroeste, com dimensões menores, poderia fazer o mesmo através de seu OBSNoroeste.
ResponderExcluirNa oportunidade de nossa visita, como de praxe, li alguns jornais locais. Num deles o sec de turismo do município de Venda Nova relatava que uma visita que tinha feito à Reg Sul do país. A conclusão dele era que Venda Nova precisa melhorar ainda mais. Essa concepção de conhecer outras experiências e aprimorar, de forma dinâmica, creio que colabore para a sustenção desse sucesso também. Percebe-se q devido ao cenário, o poder público atua de forma planejada. Ou não?
Angeline,realmente nessas experiências estão presentes o conhecimento, processos inovativos e planejamento. Acredito que a nossa região tem recursos que podem potencializar importantes resultados econômicos. Para isso é preciso mudar a forma de pensar as localidades. O processo de mudanças não pode ficar concentrado e dependente da estrutura pública. A sociedade privada precisa participar do planejamento local e do processo decisório que definem as estratégias e ações em direção ao bem estar social.
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