Premio Nobel para Regulação de Mercados
JORNAL O GLOBO
ESTOCOLMO - O economista Jean Tirole venceu o Prêmio Nobel de Economia, informou nesta segunda-feira a Academia Sueca de Ciências. Primeiro francês a ser laureado na categoria desde 1988, Tirole se destacou por seu trabalho na área de regulação de mercados: suas teorias ajudam governos a controlar melhor as grandes empresas, principalmente em setores onde o monopólio ocorre mais naturalmente. O laureado tem 61 anos e leciona na universidade de Tolouse, na França.
Segundo a Academia, Jean Tirole é “um dos mais influentes economistas do nosso tempo”. A entidade destaca que é comum que alguns setores sejam dominados por poucas empresas, o que costuma gerar efeitos “socialmente indesejáveis”, como preços altos demais, que não sejam baseados nos custos do produto.
“Desde os anos 1980, Jean Tirole tem dado fôlego novo à pesquisa desse tipo de falhas do mercado. A sua análise de empresas com poder no mercado une teoria a questões de políticas, como como os governos deveriam lidar com os cartéis, e como eles deveriam regular monopólios”, disse a Academia, em comunicado.
TEORIA PARA DOMAR AS GIGANTES
- O trabalho de Tirole é aplicado a setores onde ocorre o que os economistas chamam de monopólio natural, como infraestrutura e telecomunicações. Esses mercados tendem a não ter uma concorrência em segmentos com muitas companhias, onde a relação entre oferta e demanda consegue, teoricamente, dar conta de manter o preço baixo e a qualidade em alta.
Boa parte da produção do economista se dedica, portanto, a estabelecer os parâmetros para regular mercados naturalmente com poucos companhias, sem prejudicar a economia. Uma das conclusões é que cada setor tem uma dinâmica própria.
Segundo Edmar de Almeida, professor do Instituto de Economia da UFRJ, o pensamento de Tirole influenciou, por exemplo, o movimento de regulação do setor elétrico e de telecomunicações no Brasil, nos anos 1990.
— Certamente o trabalho do Tirole influenciou toda a leva de reformas no Brasil. Contribuiu para a teoria de regulação, amplamente utilizada na década de 1990. Por exemplo, tarifas que eram definidas simplesmente pelo custo do serviço passaram a ser definidas por teto de preço. São mecanismos tarifários como esse que tentam emular as situações de mercado — explica o especialista.
A coordenadora do Centro de Estudos em Regulação e Infraestrutura da FGV, Joisa Campanher Dutra, explicou que Tirole fez contribuições valiosas, ao lado de Jean-Jacques Laffont (morto em 2004), para analisar o conjunto de conflitos para o regulador quando há poucas ou apenas uma empresa atuando em determinado setor. São situações em que há assimetria de informações, ou seja, a empresa que presta o serviço detém mais informações que o regulador. Isso ocorre, por exemplo, em setores como energia, telecomunicações, saneamento, fornecimento de gás, entre outros.
— Tirole contribuiu, por exemplo, com a ideia de que é possível oferecer diferentes opções, cardápios e menus de contratos para gerar os incentivos corretos. Ele tem a avaliação de que é preciso avaliar os diferentes setores e diferentes regiões, que podem apresentar diferentes dilemas. Não há uma solução única — apontou Joisa.
Coordenadora de Estudos de Regulação e Mercados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Lucia Helena Salgado e Silva destacou a importância de Tirole para a teoria moderna da regulação econômica baseada em incentivos.
O economista Aloísio Araújo, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) e do Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa), considerou positivo o prêmio ter saído nesta área e destacou a importância do trabalho de Tirole, com quem conversou recentemente, em uma passagem pela universidade de Harvard, nos EUA.
— Fico muito contente. O comitê da Suécia está mantendo o alto padrão de escolha — lembrou Araújo, destacando que o Brasil pode aprender com o trabalho do laureado:
— Acho que temos muito que avançar. Têm grandes ramos que a gente pode melhorar. No ramo bancário, temos bons avanços, como o da portabilidade.
A Academia definiu o trabalho do francês como o de um "engenheiro".
— Como um engenheiro, ele oferece as ferramentas para resolver problemas que se aplicam, independentemente das preferências políticas — disse Tore Ellingsen, presidente do comitê do prêmio, após ser perguntado se a escolha havia sido política, em um momento de crise de regulação do setor bancário na Europa.
ANÚNCIO SURPREENDEU PREMIADO
A notícia surpreendeu o economista, que agradeceu aos amigos e dedicou o prêmio a Jean-Jacques Laffont, com quem desenvolveu o centro de estudos econômicos em Toulouse.
"Ainda não me recuperei (da emoção), mas imediatamente pensei em todos aqueles que me ajudaram com minha carreira, e minha família, é claro. E em particular a pessoa que começou o trabalho aqui em Toulouse, Jean-Jacques Laffont, que faleceu (em 2004) e provavelmente teria merecido estar comigo hoje recebendo o prêmio" afirmou o economista, em entrevista por telefone ao site oficial do Prêmio Nobel.
Havia uma expectativa entre especialistas de que o Nobel de Economia em algum momento premiasse a área de estudo da economia da regulação. Jean Tirole receberá um prêmio de 8 milhões de coroas suecas (US$ 1,1 milhão). O prêmio de economia, oficialmente chamado de Prêmio Sveriges Riksbank de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel, foi criado em 1968 e não fazia parte do grupo original de honrarias estabelecidas pelo magnata que criou a dinamite, definidas em seu testamento, em 1895.
A divulgação desta segunda encerra a sequência de prêmios deste ano. Na semana passada, a Fundação distribuiu cinco láureas, inclusive o Nobel da Paz, vencido pela jovem paquistanesa Malala Yousafzai.
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